A primeira palavra que as pessoas associam com livro é «conhecimento», «saber», ou «cultura». Porém, no meu caso, a primeira palavra com a qual associo é terapia. Isso porque sou um especialista em Biblioterapia e a boa notícia é que já tenho meu título de pós-doutor em Psicologia com orientação em metodologia de investigação da revisão, título este, expedido pela Faculdade de Psicologia da Universidade de Flores, cuja Faculdade de Psicologia e Ciências Sociais merece minhas mais sinceras palavras de reconhecimento por sua enorme capacidade de ensino e profissionalismo. É impossível não citar a Doutora Analía Losada, que nos proporcionou uma excelente orientação nesse processo de formação científica e profissional, com um calor humano poucas vezes visto em âmbitos acadêmicos desse nível.
Ao mesmo tempo quero dedicar um agradecimento muito profundo ao grupo de colegas do pós-doutorado, que me transmitiram o valor da cooperação, do intercâmbio de ideias e da perseverança. Com certeza lhes dedico essa nova conquista alcançada em minha carreira científica.
Gostaria de compartilhar com o leitor um breve resumo do trabalho intelectual realizado.
Em primeiro lugar, informar minha formação completa, sou Pós-doutor em Psicologia com Orientação em Metodologia da Revisão, Doutor em Psicologia Social, graduado em Bibliotecologia e documentação, e especialista em Biblioterapia.
Em segundo lugar, mencionar que desde minha mais terna infância, encontrei no livro um bálsamo com o qual melhorar meus próprios estilos de enfrentamento, o amor que sentia (e que sinto) ao desfrutar de uma boa leitura, e foi esta a base vivencial que me permitiu, desde o começo, associar o livro ao seu aspecto terapêutico.
Aquilo que pode ser fortalecido junto com os mecanismos psíquicos para afrontar as dificuldades da vida e que todas as pessoas põem em funcionamento a partir da resiliência, pode ser estimulado com uma leitura recomendada, especialmente direcionada de acordo com as circunstâncias, as pessoas ou os contextos caracterizados por estados de privação ou sofrimento.
Então, a leitura alcança uma dimensão social, científica e humana muito profunda, que situa a Bibliotecologia e a Psicologia como uma aliança estratégica suscetível de transmitir o valor do livro em sua vertente proporcionadora de sentido, identidade, de oportunidade, nem mais, nem menos, que a partir da literatura faz do impossível, possível.
Em terceiro lugar e antes de poder comentar a respeito de alguns artigos escritos sobre a Biblioterapia, gostaria de estender um pouco mais essa introdução, um tanto quanto, autobiográfica para mencionar a influência de Viktor Frankl que tornou possível o impossível, desde os campos de concentração nazistas como prisioneiro, por sua condição de judeu, onde descobriu que o último que pode ser arrebatado de um homem é a sua ,liberdade de escolha, por exemplo, a liberdade de dar um último e pequeno pedaço de pão a alguém mais, em lugar de comê-lo para sobreviver, explica a existência da dimensão humana, que não ´pode ser reduzida por nenhum tipo de determinismo, algo muito frequente nas teorias psicológicas pós darwinistas de meados do século XX.
A dimensão espiritual do ser humano exige o estudo de uma psicologia e psicoterapia do sentido, daquilo que tem valor para cada pessoa e que pode funcionar como um apoio para levar a vida da melhor maneira suportável, algo que no contexto do nazismo se transformou em uma questão de vida ou morte, sem ir mais longe.
Ou seja, é ter um «para que» viver, a leitura de um livro, além do aporte do sentido, pode ser também uma fonte de resiliência.
Finalmente dizer que em meu trabalho de pesquisa me encontrei com a ideia de que hoje as neurociências apoiam as perspectivas que orientam o cultivo de um propósito de vida e, as investigações em Psicologia positiva sustentam que esse sentido pode influenciar inclusive na expectativa de vida.
Emoções como a gratidão, a esperança, a compaixão, reforçam o sentido de vida e podem favorecer a resiliência. Todas essas emoções podem ser transmitidas por um livro.
Desta maneira, ao longo de minha trajetória de vida e acadêmica, fui me dando conta de que, a partir de suas muito distintas e complexas vertentes, a Biblioterapia apresenta temáticas que exigem conhecimentos de distintos especialistas a partir de diferentes disciplinas.
No caso do tema que eu investigo, validez científica da Biblioterapia para tratar a neurose noógena em populações vulneráveis, é necessário, através de consenso científico, comprovar evidências suficientes para essa tessitura.
Encontrei em minha investigação bases teóricas que permitem comprovar que em torno da leitura existem processos biopsicológicos, tais como, por exemplo, o desenvolvimento do intelecto, que justificam, a partir de outras perspectivas, a importância do livro como recursos terapêutico.
Ademais, com o auxílio das neurociências pode-se entender melhor sobre o processo mental que enriquece a experiência leitora, o hábito da leitura possibilita novas dimensões de espaço-tempo, que possibilita a uma pessoa, afrontar com flexibilidade situações problema do presente. A neurociência compreende justamente que existe uma fusão dos sentidos que é promovida no cérebro do leitor.
No artigo mencionado, Revisão sistemática de artigos sobre Biblioterapia e o sentido de vida, faço referência, entre outras questões, sobre como o enriquecimento cognitivo que é reflexo do hábito leitor possibilita destacar a importância deste para facilitar e estimular a rede neuro cognitiva do cérebro humano.
Rede em que está implicada as ferramentas de compreensão de textos, que favorece que uma pessoa possa em sua vida cotidiana ter uma maior capacidade de valorizar cada experiência vivida, esta favorece a edificação do sentido de vida, que, em todos os casos, fortalece os mecanismos psíquicos de resiliência.
Isso é fundamental para compreender sua importância e aplicação nas diversas instituições, caracterizadas pela presença de um tipo de depressão existencial ou vazio de sentido, que dificulta a estrutura psicossocial, debilita o estado de saúde e atenta contra a adaptação social nestas populações vulneráveis.
Portanto, o artigo abarca o papel do Biblioterapeuta nas diversas instituições e reivindica sua função de resgate dos mecanismos psíquicos que funcionam para sanar aspectos vinculados ao sentido de vida. Através da catarsis, a liberação, o alívio, o desenvolvimento da imaginação e a criatividade, a leitura, na perspectiva da Biblioterapia pode ser aplicada em pacientes com vícios, grupos de terceira idade, presos com condenações extensas, etc.
O artigo intitulado Revisão sistemática de artigos sobre Biblioterapia e sentido de vida apresenta então, o marco científico para validar este recurso em intervenções psicossociais e comunitárias.
Por outra parte, quem desejar conhecer aspectos filosóficos mais abrangentes, bem como a história da Biblioterapia, pode consultar a entrevista realizada pela Dra Analía Losada para a Revista de Psicologia da Faculdade de Psicologia da Universidad de la Plata.
Nesta entrevista desenvolvo mais sobre evolução histórica do conceito biblioterapêutico até a modernidade, menciono como foi ganhando lugar sua aplicação em distintos cenários sócio comunitários, dando conta do processo de aproximação paulatino entre a Bibliotecologia e a Psicologia.
Ademais, compartilho os fundamentos teóricos da Biblioterapia inseridos na Logoterapia e os três pilares desta última: a liberdade da vontade, que envolve a capacidade de ser livre da determinação instintiva e sócio cultural, a vontade de sentido, que inclui a autotranscendência por meio da capacidade de preferir valores e o sentido da vida que se sintetiza na relação pessoal cheia de significados positivos e singulares.
Na mencionada entrevista é possível perceber como os livros estimulam a transformação da personalidade do leitor em um processo psicológico de apropriação de histórias, o qual resulta indispensável para compreender a psicologia da identificação para o desenvolvimento do protagonismo, a catársis e a introspecção.
O humano é uma dimensão singularmente dotada de sentido e a Biblioterapia deve ser definida conforme esse marco conceitual, ou seja, sem faltar essa dimensão singular, não é causalidade que um dos problemas que mais acomete a humanidade do século XXI seja a depressão, que sem dúvida traz consigo a falta de sentido como elemento patológico constituyente.
Tal como foi desenvolvido na referida entrevista, o benefício mais crucial da leitura é configurar-se como esse antídoto contra a falta de sentido tão presente em nossas sociedades contemporâneas.
É justamente a partir dessa perspectiva que, na entrevista, explico como se relaciona a Biblioterapia com a frustração existencial.
Sobretudo, dando conta de que, como instrumento de intervenção psicossocial, a Biblioterapia dentro dos tratamentos denominados não invasivos.
Isso conduz à minha teoria de que é benéfico aplicar a Biblioterapia como recursos terapêuticos para populações vulneráveis, validando assim o instrumento psicossocial do livro (Biblioteca nas instituições com profissionais da Bibliotecologia e Psicologia e áreas afins à Biblioterapia).
Entre outros dados que aporto a esse respeito, refiro-me que a leitura, nesse contexto, ativa o interesse, desperta o sentido, aporta motivação, promove a empatia, entre outras qualidades.
Isso se investigou a partir de diferentes disciplinas, tais como a Psicologia Social, a Antropologia, a Medicina, a Sociologia, que têm maior relevância na construção do consenso científico.
De fato, escrevi um artigo diferente, especialmente dedicado à construção do consenso científico que pode aportar um panorama muito mais enriquecedor da perspectiva interdisciplinar, transdisciplinar e intradisciplinar, que caracterizam os cenários dos estudos de altos níveis acadêmicos da atualidade.
Esse é um artigo muito interessante, no qual podemos aprender a importância que tem a função dos especialistas nas distintas áreas de estudo, o rigoroso processo de categorização de um texto entendido como científico e os elementos indispensáveis para elaborar artigos para a ciência. Neste sentido, é cada vez maior a importância de estudos meta-analíticos para uma comunidade de pesquisadores, já que facilita a discriminação de informação relevante e sensível que possa facilitar a tomada de decisões.
Esses protocolos têm uma história moderna e funcionam bem nestes tempos de muita informação, que, muitas vezes, não está sustentada por fundamentos válidos do ponto de vista da racionalidade técnica.
Escrevi vários artigos sobre temáticas afins.
Gostaria de convidar o leitor que deseja aprofundar neste tema a ler outro artigo, desta vez sobre o método PRISMA, que escrevi sobre o tema da Biblioterapia, onde aprenderá o que é exatamente um pós-doutorado, tema que abordo além da perspectiva acadêmica.
Ademais, respondo perguntas específicas, como por exemplo, «O que é um artigo de revisão?» «Qual o objetivo?» » Que função cumpre no desenvolvimento da ciência e da vida cultural?»
E outros temas muito interessantes tais como o sistema de revisão por pares a cegas, ou algumas orientações utilizadas por um grupo seleto de doutores pesquisadores em Psicologia.
Finalmente seria recomendável uma leitura de minha publicação recente, intitulada «Implicações noéticas da leitura e o recurso logoterapêutico da Logoterapia«, realizado em cooperação com Dra. Suzaneide Oliveira Medrado.
Neste texto exploramos a literatura como cenário onde se dá o diálogo do leitor com o que se lê e que configura uma dinâmica particularmente singular, atravessada pelo universo de significados que subjaz de forma subjetiva no horizonte do leitor. Não se deve esquecer que toda leitura representa um aspecto fundamental na formação do ser humano enquanto tal, que adquire seu caráter mais concreto na interação com os outros mediada pelo uso da linguagem.
A noética diz respeito a um olhar sabidamente reflexivo, associa-se à intelecção, mesmo à intuição inteligível que a percepção conceitual implica. Para Frankl, sempre esteve relacionado a uma dimensão exclusivamente humana, que envolve pensamento reflexivo, contemplação e se manifesta com autoconsciência.
Por exemplo, existe a capacidade noética de autodistanciamento, que é um elemento essencial para o processo de leitura, mas também se aplica a todo tipo de análise existencial que as pessoas realizam diante de situações problemáticas de vida. Como tal, essa habilidade é estabelecida pela leitura e é estimulada por ela.
Outro aspecto vital ligado à noética explica aquela transmissão de experiências que ocorre quando há um contato genuíno com a obra de um autor por meio da leitura de seus textos. Esta contribuição é fundamental considerando que toda liberdade humana é exercida pelo ato de decidir, e em cada escolha são reproduzidos os recursos h resultados de matrizes experienciais que tecem a historicidade de cada pessoa, em nível de linha do tempo, mas também em um nível de desenvolvimento psicológico de apropriação da aprendizagem entre pares e fontes de informação do hábito da leitura.
Mais uma vez expresso a minha gratidão por toda a jornada feita até aqui com tantas pessoas maravilhosas com quem aprendi muito, não só sobre psicologia, ciências e estudos de revisão, mas sobre a importância de formar equipas onde convergem especialistas de diferentes disciplinas para a solução técnica de problemas humanos.
Mais uma vez, muito obrigado à Universidade das Flores. À Dra. Analía Losada e a toda equipe de doutorados e colegas pós-doutorados que tornaram esse aprendizado tão virtuoso.
Com carinho Antonio Román.
Pós-doutorado em Psicologia com orientação em Metodologia de Pesquisa de Revisão.